O Marco Civil da
Internet pode ser votado na terça em meio a disputas políticas
Se tudo correr como previsto, o Marco Civil da Internet –
lei que definirá direitos dos usuários de internet no Brasil – será votado
amanhã na Câmara. O governo fez um acordo para acelerar a votação de três leis
sobre a internet no País: o Marco, que funciona como uma Constituição que
garante os direitos, e as leis Azeredo e “Carolina Dieckmann”, que tipificam
crimes online. Só que, no final, os deputados só votaram a tipificação dos
crimes. As garantias ficaram para depois.
“Na hora da votação surgiram novas dúvidas e resistências.
Como se trata de um tema muito técnico, e com um grande impacto na internet
brasileira, os parlamentares estavam inseguros”, diz o relator do projeto,
deputado Alessandro Molon (PT-RJ), que passou o dia todo conversando com os
parlamentares. Não adiantou. Ele disse ter combinado de votar o Marco antes das
leis penais, mas houve “resistências parlamentares”.
Alvo de disputas corporativas e políticas, o texto que foi
discutido por meses em consultas públicas foi modificado na reta final de
negociações. Desde julho, sua votação foi cancelada três vezes por falta de
consenso.
A saída encontrada pelo relator foi modificar dois pontos. O
primeiro, que determina a neutralidade (que diz que empresas não podem filtrar
nem discriminar o tráfego na internet), provocou mal-estar com o Ministério das
Comunicações.
Houve uma reunião na terça-feira, na véspera da votação,
para definir o tópico. A redação inicial determinava que o Comitê Gestor de
Internet no Brasil regulamentasse a neutralidade, mas o governo não queria
menção ao órgão. A solução encontrada foi que a regulamentação “caberia ao
poder executivo” – mas não à Anatel, como defende o ministro das Comunicações,
Paulo Bernardo.
“No dia seguinte eu fui surpreendido com uma declaração do
Ministério das Comunicações de que a regulação caberia à Anatel. Percebendo que
os termos de acordo não ficaram claros, achei mais prudente voltar ao meu texto
original, recolocando que a neutralidade seria regulamentada por decreto da
presidência”, diz Molon.
Direito autoral.
O texto só foi fechado pouco antes da votação, ainda na manhã de quarta-feira.
O que atrasou foi um pedido de outro ministério – desta vez, o da Cultura.
Marta Suplicy estava preocupada com a repercussão do artigo 15 – que diz que os
provedores não podem ser responsabilizados pelo conteúdo postado pelos
usuários, a não ser que descumpram um pedido judicial de remoção. Isentas de
culpa, as empresas não precisam remover um conteúdo infrator – como ofensas ou
pirataria – a não ser que a Justiça as obrigue e o pedido não seja acatado.
Segundo Molon, Marta pediu que fosse explicitado “que o
projeto não afetava a disciplina de direitos autorais no País”. No fim, foi
incluído um inciso que isenta a área. Ou seja, se uma empresa reclamar que um
vídeo no YouTube é pirata, o Google pode removê-lo sem o consentimento do
usuário. E sem ordem judicial – como é hoje, em que a prática de “notice and
take down” (notificação e retirada) de conteúdo acontece, mas não é
institucionalizada.
“Isso pode mudar na reforma da Lei de Direitos Autorais”,
diz Molon. Em entrevista ao Estado na sexta-feira, a ministra da Cultura
admitiu que pretende criar um mecanismo para notificar e remover conteúdo
pirata online, como ocorre nos EUA.
“Durante todo o processo os mais diversos lados queriam
tratar desta questão. E nós insistimos que o Marco não é o lugar. O inciso 2 do
artigo 15 explicita a posição. O Marco trata de liberdade de expressão, do
funcionamento da rede, e não muda os direitos autorais”, diz o relator.
Segundo ele, o texto ainda pode ser modificado até a votação
de amanhã. A aprovação é uma “tarefa difícil”, mas o deputado está confiante.
“Não é fácil, tem muitos interesses econômicos envolvidos e contrariados, mas
eu acredito que a gente tem uma possibilidade enorme de aprovar o Marco amanhã.
Mas é preciso do apoio da sociedade, dos ativistas, acadêmicos.”
Do Estadão
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