“No caso do polidor e amolador fixo, trata-se de um sítio tipo oficina, no qual os homens elaboravam artefatos, como machados, em suportes de grandes blocos ou superfícies rochosas, deixando várias marcas de polimento ou amolação no local”, explica.
Nanci destaca que era uma unanimidade entre os arqueólogos que, no estado do Rio de Janeiro, esse tipo de sítio ocorria, exclusivamente, no litoral, como em Cabo Frio e em Angra dos Reis. Com a descoberta, segundo a pesquisadora, o passo seguinte será fazer um mapeamento georreferenciado da região para encontrar outros sítios semelhantes e, possivelmente, algum sítio de habitação que forneça informações sobre o padrão de subsistência, as tecnologias usadas, as formas de moradia e, caso haja sepultamento, poderia-se até saber a morfologia do corpo humano daquela população.
Oito estudantes do ensino médio, moradores de Miracema, foram selecionados para trabalhar na pesquisa, recebendo bolsa Jovens Talentos, da FAPERJ. “Vamos dar suporte teórico e deixar tarefas pré-determinadas, além de oferecer palestras sobre identificação de vestígios arqueológicos. A cada encontro, os alunos vão apresentar relatórios e resultados. Nossa maior preocupação é enfatizar a necessidade de sinalizar as peças encontradas, sem retirar absolutamente nada do lugar. Em visitas periódicas, vamos confirmar a descoberta, para, em seguida, pedir autorização ao Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para fazer intervenções, retiradas de peças e escavações no local.”
Montando a história de Miracema
Segundo Nanci, os sítios arqueológicos são importantes porque ajudam a reconstruir o passado, tanto que, no Brasil, são considerados patrimônio nacional, protegidos por lei, sob a responsabilidade do Iphan. “Temos uma vasta bibliografia de viajantes, descrevendo os habitantes do noroeste fluminense e seus hábitos, a partir da segunda metade do século XVIII, quando o interior do Rio de Janeiro começou a ser ocupado. Ao que tudo indica, tratava-se de uma população indígena da etnia puri. Depois, a mesma região de Miracema, já com trabalho escravo, passou pelo ciclo do açúcar, pela produção de café e de algodão. Os resquícios arqueológicos são fundamentais para montar todo esse quebra-cabeça”, aposta a pesquisadora.
Como Nanci explica, inicialmente foram traçadas três linhas de pesquisa: a primeira é buscar a identificação dos vestígios arqueológicos pré-coloniais, para confirmar, ou não, a ocupação indígena puri; a outra é fazer um levantamento bibliográfico das características socioeconômicas da expansão colonial, buscando discutir de que maneira a região se transformou em uma cidade independente, depois do desenvolvimento da indústria têxtil; e, por último, traçar uma arqueologia da memória, ou seja, entrevistar os idosos da região, preferencialmente os descendentes de índios, escravos e colonizadores.
Na verdade, o sítio arqueológico da fazenda Santa Inês foi descoberto em dezembro de 2011, durante a XIII Jornada Científica do Projeto Jovens Talentos para a Ciência. “Estava programada uma visita à fazenda para que os jovens conhecessem alguns aspectos culturais e históricos da região. Dois jovens do programa, Charles Gloria e Paulo Reynaldo, que já trabalharam com arqueologia em Angra dos Reis, identificaram características que levavam a crer que o local podia ser um sítio arqueológico. Em abril, fomos até lá e confirmamos”, revela Nanci.
Destinado a estudantes do ensino médio ou técnico da rede pública estadual de educação, o Jovens Talentos para a Ciência é o programa de pré-iniciação científica, da FAPERJ em parceria com a Fundação Centro de Educação a Distância do Estado do Rio de Janeiro (Cecierj). O objetivo é estimular, nos alunos, o interesse pela ciência e tecnologia e identificar o potencial para atuar em pesquisa, além de contribuir para a difusão dos conhecimentos científicos, desmistificando a ciência e articulando pesquisa e ensino.
A pesquisadora ressalta que a participação dos estudantes de Miracema no mapeamento dos sítios arqueológicos é fundamental para se criar estratégias de preservação junto as comunidades e as autoridades. “Por desconhecerem o assunto e sua importância, muita gente destroi ou pega artefatos arqueológicos. Estimular a educação patrimonial nos jovens é o primeiro passo para que o conhecimento se espalhe. Os estudantes se engajam no projeto e passam esses conceitos aos membros da família e amigos”, afirma Nanci. Ela destaca a parceria com o professor Julio Cralia, da Universidade Federal Fluminense (UFF), campus de Campos dos Goytacazes, e do professor Jorge Belizário de Medeiros Maria, responsável pelo programa Jovens Talentos, na FAPERJ.
Assessoria de Comunicação FAPERJ
Do Planeta Universitário
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