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segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Ela fez a diferença


Ao adotar uma política de transparência e reconhecer os problemas vividos pela Petrobras, a presidente Graça Foster virou o jogo e recuperou a confiança do mercado, fazendo com que as ações voltassem a subir.

Por Rosenildo Gomes FERREIRA
A executiva Graça Foster, presidenta da Petrobras, viveu o maior desafio de sua curta gestão, iniciada há pouco mais de seis meses, na segunda-feira 6. Nesse dia, ela apresentou os números do balanço do segundo trimestre de 2012, cujo desempenho surpreendeu até mesmo o mais pessimista dos analistas. Os dados falam por si: um prejuízo de R$ 1,34 bilhão, o pior resultado da estatal desde 1999. A expectativa era de um lucro em torno de R$ 2 bilhões, número que já seria 78% inferior ao dos três primeiros meses deste ano. Como explicar essa situação? A variação cambial, é certo, teve sua parcela de culpa. No entanto, fatores estruturais ligados à exploração de petróleo também colaboraram. 
 
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Graça Foster, presidenta da Petrobras: "Justificamos, com números, todos
os itens negativos do balanço e o que estamos fazendo
para corrigir a situação".
 
Um deles foi o reconhecimento da inviabilidade comercial de 41 poços perfurados, considerados secos e nos quais foram investidos R$ 2,73 bilhões. Diante desse cenário, com potencial de causar efeitos nefastos na carreira de qualquer executivo, Graça cresceu. Em vez de se encastelar no seu escritório, ela foi para a linha de frente da crise. Primeiro fez questão de comandar a reunião com os analistas do mercado financeiro, algo inédito na rotina da estatal. Normalmente, quem conduz esse tipo de encontro é o diretor-financeiro, Almir Barbassa. No dia seguinte, Graça rumou para São Paulo, onde participou do 13º Encontro Internacional de Energia, promovido pela Fiesp. 
 
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Aposta no futuro: com a descoberta da camada do pré-sal, o Brasil dobrou suas reservas
de petróleo para 31 bilhões de barris.
 
No evento, ela recebeu afagos do empresário Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, presidente da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), que elogiou sua capacidade de se comunicar com o mercado. Depois, a executiva enfrentou um batalhão de repórteres e cinegrafistas. Tudo na maior tranquilidade. Graça fez uma apresentação otimista, lembrando os pontos fortes da estatal e os benefícios que a campanha de exploração do pré-sal deve gerar para a economia brasileira (veja quadro ao final da reportagem). “Mais do que dar uma explicação ao mercado, nós justificamos, com números, todos os itens negativos do balanço e o que estamos fazendo para corrigir a situação”, disse Graça. A atitude da executiva deu resultado. 
 
As ações preferenciais da empresa, que, na segunda-feira chegaram a cair 5,46%, encerraram o pregão na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) com ligeira baixa de 0,1%. Na sequência, os papéis inverteram a tendência e fecharam na quinta-feira 9 em R$ 21, acumulando uma alta de 5,42% em apenas três dias. A melhora no “humor” dos investidores em relação à Petrobras foi fruto direto da atuação de Graça. “Com sua postura transparente, ela conquistou a confiança do mercado”, disse Marcus Sequeira, analista especializado em petróleo da filial do Deutsche Bank, em Nova York. “Desde que a Petrobras revisou seu plano de investimentos ficou claro que Graça estaria disposta a mostrar também os eventuais problemas vividos pela companhia.” 
 
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O cenário, no entanto, mantém-se desafiador para a estatal, um colosso que no ano passado faturou R$ 244 bilhões, lucrou R$ 33 bilhões e emprega 81,9 mil funcionários. É que além de dificuldades conjunturais, com a valorização do dólar sobre o real, a Petrobras tem de enfrentar uma série de questões estruturais. As mais urgentes são a redução de custos e a recuperação da capacidade produtiva dos poços de petróleo e gás da Bacia de Campos, no litoral norte do Estado do Rio de Janeiro. Apenas a exploração dos campos consumiu 35% mais recursos em relação ao período anterior. 
 
Para melhorar esse desempenho, a Petrobras separou US$ 5,1 bilhões. A queda de 5% na produção, aliada ao aumento da demanda de gasolina, em 16%, e de diesel, 5%, também ajudam a explicar o resultado negativo da petrolífera. Para abastecer o mercado, foi preciso importar 170 mil barris de petróleo por dia, volume mais de três vezes superior ao do primeiro trimestre. “Quando o dólar atingiu a marca de R$ 2, soou o sinal de alerta na empresa”, afirmou Graça. Em um cenário no qual o preço de venda do diesel e da gasolina estão defasados em até 20%, de acordo com estimativas de Auro Rozenbaum, analista de petróleo da Bradesco Corretora, a conta não poderia, realmente, fechar no azul. Nem por passe de mágica.
 
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No comando: Graça (à dir.) mostra à presidenta Dilma detalhes da sala de controle
da plataforma P-59, lançada em julho, no litoral da Bahia.
 
REAJUSTE Se por um lado o prejuízo colocou a estatal na “linha de tiro”, por outro, ajudou a abrir espaço para as discussões em relação ao reajuste dos combustíveis, um velho pleito de sua direção e do próprio mercado. Esse, aliás, é um dos motivos que explicam a decisão dos investidores de voltar a apostar nos papéis da Petrobras. “Não existe nenhuma indicação de que a cotação do barril do petróleo vá cair para a faixa abaixo de US$ 100”, diz Rozenbaum. “Por conta disso, não há dúvida de que a Petrobras está perdendo dinheiro.” O último aumento para o consumidor, nos postos de serviço, ocorreu em setembro de 2005. A presidenta da Petrobras garantiu que não fez nenhum pedido nesse sentido. 
 
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Apenas vem deixando claro em todas as reuniões do Conselho de Administração da estatal – a última delas ocorreu na sexta-feira 3 – a necessidade aproximar a paridade entre o preço interno e o cobrado no Exterior. “Quem produz e tem volume sempre espera vender por um preço melhor”, disse. O debate reacendeu a discussão entre o Ministério de Minas e Energia e o da Fazenda. “O reajuste é necessário”, afirmou Edson Lobão, ministro de Minas e Energia. Guido Mantega, que preside o Conselho da estatal, disse, por meio de sua assessoria, que “não há perspectiva no horizonte para novos reajustes”. Ao longo do governo do PT, uma das estratégias para manter os preços sob controle sem afetar muito o desempenho da empresa tem sido mexer na tributação sobre o setor. 
 
Especialmente, nas alíquotas da Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico (Cide), reduzidas a zero, em 22 de junho. Com isso, a Petrobras embolsa mais reais por cada litro de combustível vendido, mas sem afetar o bolso dos consumidores. São esses argumentos que Mantega utiliza para defender seu ponto de vista. Sem contar, é claro, o receio de que um reajuste contamine os índices de inflação, dada a repercussão sobre o restante da economia provocado pelo preço dos combustíveis. Ao que tudo indica, a questão terá como árbitro a presidenta Dilma Rousseff. Afinal, com uma necessidade de gerar caixa para cumprir o plano de investimentos, orçado em US$ 236,5 bilhões para o período 2012-2016, a Petrobras não pode se dar ao luxo de perder dinheiro. 
 
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Operação refino: meta da Petrobras é inaugurar, até 2017, o Complexo Petroquí-mico
do Rio (foto) e a refinaria Abreu e Lima, no Recife.
 
Com essa bolada, Graça pretende colocar a Petrobras em um novo patamar. E sua principal arma é a exploração dos poços situados na região do pré-sal, que deverão quase dobrar as reservas brasileiras, dos atuais 15,7 bilhões para 31 bilhões de barris de petróleo, até o final de 2020. O patamar atual de 2,1 milhões de barris diários já garante a autossuficiência do País. Mas para atingir o objetivo previsto para o final da década, a executiva precisará desatar alguns nós. Com ou sem aumento, não há indicação de que o ritmo do consumo de gasolina deva parar de crescer. 
 
A intensificação do uso de fontes renováveis, como etanol, esbarra em questões que não dependem da ação da estatal, como a falta de capacidade instalada das usinas de álcool para atender à demanda interna. A ampliação da capacidade de refino de gasolina também está descartada. É que as refinarias em construção, a unidade de Abreu e Lima, no Recife, e o Polo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) foram desenhados para trabalhar com nafta, diesel e querosene de aviação. Hoje, os dois últimos têm um grande peso na balança de importações da companhia. “Quando programamos esses projetos, o cenário que vislumbramos era de crescimento da produção e demanda por etanol”, afirmou Graça. “Agora, não temos como mudar isso.”
 
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DESAFIOS É nesse ponto que os analistas enxergam os maiores desafios da primeira mulher a dirigir a maior empresa do País. O relatório assinado por Sequeira, distribuído aos clientes globais do Deutsche Bank, aponta dois riscos estruturais para a companhia. O primeiro deles é a capacidade da Petrobras de construir no prazo, com um custo competitivo, essas refinarias. A mais problemática é a situada no Recife. Na semana passada, o canteiro de obras se transformou em uma praça de guerra, por conta do conflito entre trabalhadores e policiais, que resultou na queima de diversos ônibus. Eles protestam contra o impasse nas negociações salariais. Apesar disso, a estatal garante que a obra deverá ser concluída até o final de 2014 e, ao custo de US$ 20,1 bilhões, nove vezes mais que o orçamento original. 
 
“Existe o temor de que o mesmo aconteça em relação ao Comperj”, afirmou Sequeira. “A localização dessas obras obedeceu a um viés mais político que econômico.” Com as refinarias, a estatal poderá ampliar para 3,4 milhões de barris/dia sua capacidade de processamento de petróleo. O tema da transparência em relação à formação de seus preços e a outras políticas da Petrobras é visto como elemento delicado na relação entre os acionistas e a direção da petroleira. Ele assumiu uma maior importância no noticiário após setembro de 2010, quando a Petrobras fez a histórica captação de R$ 120,4 bilhões na Bovespa, a maior feita até hoje em bolsa no mundo. “Cada vez que aumenta o grau de transparência de uma empresa cresce a confiança e reduz as incertezas”, disse Carlos Eduardo Lessa Brandão, conselheiro de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). 
 
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“E isso vale para qualquer empresa, seja de controle estatal ou privado.” Essa preocupação do mercado estaria por trás do desempenho insatisfatório dos papéis da companhia. A ausência de sinais nesse sentido fez com que as ações da empresa entrassem em trajetória descendente. É exatamente isso que Graça, com seu estilo franco e direto, tenta reverter. Outra questão que preocupa o mercado é em relação à exigência de um conteúdo nacional elevado, no mínimo 60%, dependendo do equipamento ou o tipo de serviço contratado (veja também reportagem aqui). A concentração de encomendas de suas sondas e plataformas em poucas empresas locais preocupa os investidores. “Trata-se de um contrassenso do ponto de vista estratégico”, diz Rozenbaum, da Bradesco Corretora. 
 
Graça rebate: “Tem de produzir aqui mesmo, debaixo de nossos olhos”, afirmou. “Isso gera mais competitividade para a companhia, pois conseguimos monitorar melhor os custos, sem a perda da qualidade.” Mas reconhece as dificuldades. “A Plataforma P-55 está com atraso de 22 meses.” Apesar disso, os analistas se mostram otimistas em relação ao futuro da empresa, especialmente devido à postura de sua presidenta. “Ter uma gestora com perfil técnico e gerencial é importante no momento em que a Petrobras se encontra em um ciclo de grandes investimentos”, afirma Rozenbaum, concedendo um crédito de confiança à executiva que ocupa o gabinete mais importante do edifício-sede de 27 andares da petroleira, no centro do Rio de Janeiro. 
 
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Colaboraram Denize Baccocina e Marcio Orsolini

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